Li certa vez um
artigo na aula de francês que dizia, em um determinando momento, que “turistas
são os outros”. Houve uma breve discussão na aula sobre a definição de
“outro”, ao que todo mundo prontamente concordou que se tratava daquele que
vinha de outro país, de outro estado, as vezes até de outra cidade. Seguindo
aquela linha lógica, poderíamos chegar até o que minha mente automaticamente
entendeu ao ler essa frase: o outro é aquele que vem de outro bairro, outra
rua, outra casa, outra cama… O outro é outra pessoa que não eu.
Talvez por isso
seja tão difícil entender os outros. Nós os olhamos como se fossem nós mesmos,
como se eles fossem capazes de compreender tudo o que somos, fomos e fazemos
simplesmente porque são humanos. Mas e se olhássemos como olhamos outros
países? Países radicalmente diferente dos nossos? Ou simplesmente como
habitantes desse país radicalmente diferente do nosso? Chineses, coreanos,
egípcios, libaneses? Poderíamos então perdoar suas atitudes diferentes? Aquelas
que não entendemos, e por isso julgamos?
Talvez.
Talvez.
Mas talvez seja
romântico da minha parte acreditar que, ao atribuir ao outro o título de
estrangeiro, fossemos todos mais tolerantes. Não é isso que a realidade nos
mostra. Somos tão rápidos em julgar aquele de uma nação vizinha quanto
aquele da casa ao lado, mas por quê? Simplesmente porque o outro não sou eu?
E se
percebêssemos que, por mais que aqui no nosso país, falemos o português, não
falamos a mesma língua?
Eu falo “eu te
amo” pra todo mundo por quem sinto forte admiração, em quem encontro prazer na
companhia. Muitos me consideram estranha.
Meu pai não
entende o que é crush, apesar de todos na minha faculdade saberem o que
significa (um coração desesperado), apesar de todas as vezes que já o disse que
era quando um coração acelera em direção ao outro que se mantém parado,
tornando inevitável o confronto.
Minha melhor
amiga, que mora no sul há mais de dez anos, gosta muito de me chamar de guria e
de dizer que me acha “querida”. Guria é menina aqui no nordeste, “boy” aqui em
Natal, mas querida não é a mesma coisa? Não. Pelo que entendo, onde ela mora se
usa “querida” pra falar de uma pessoa que é muito amada, muito admirada,
enquanto por aqui o pessoal só usa como vocativo.
E ainda tem mais
essa – eu adoro chamar aqueles que gosto de querido ou querida, mas pra muitos
conhecidos essa palavra significa uma afastamento, um certo desprezo e
condescendência. Como pode que uma mesma palavra tenha um significado tão
diverso pra pessoas que se criaram do mesmo jeito, no mesmo lugar que eu?
O tempo, talvez,
que insiste em mudar as palavras, as pessoas e os lugares. Mas eu reitero que a
explicação é ainda mais interessante: somos todos turistas nas vidas
alheias, estranhos para aqueles que não são nós mesmos, mesmo que
compartilhemos genes ou cultura.
Os outros falam
uma língua diferente da minha. Os outros têm hábitos peculiares, crenças
estranhas, gostos excêntricos. Os outros me julgam e eu os julgo, e ao
permitirem que eu adentre o território da sua existência eu sou
inevitavelmente mudada, influenciada pra melhor ou pior pelo que aprendo em
campo alheio.
Os
países são reflexos de seus cidadãos.
Quem faz de nós
o que somos são os turistas.
Somos todos
turistas na vida dos outros.
*Bárbara de Medeiros atualmente estuda Direito Internacional na cidade de Poitiers, França. Saber mais sobre a mesma, consultar postagens mais antigas neste blog.
Nenhum comentário:
Postar um comentário